terça-feira, 24 de agosto de 2010

Ano II - Aula 3ª -
Arts. 14 a 18 do CPC
Matéria : Processo Civil
Prof. Ulderico Pires dos Santos

DOS DEVERES DAS PARTES E DE SEUS ADVOGADOS – (Art. 14 CPC)- Os autos dos processos não podem ser utilizados para que uma parte ofenda os brios da outra, ou outras, com palavras ofensivas ou mesmo grosseiras e injuriosas, pois é vedado que possa uma aviltar a outra. Com muito mais razão, nenhum advogado pode fazer referências injuriosas ou desonrosas contra o outro, mormente por escrito em suas peças de defesa. Isto é, o decoro judicial veda-lhe o uso de expressões injuriosas, infamantes, ou de fazer uso de linguagem desabrida que ofenda a honra, a dignidade do seu ex-adverso.

Quando uma das partes ou seu advogado o fizer, mediante insinuações malévolas em suas razões, a ofendida ou o seu advogado poderá requerer ao juiz que as mande riscar. Pode e deve o magistrado diretor do processo ordenar de ofício ao escrivão que risque as palavras ofensivas, de modo a resguardar a dignidade da justiça e reprimir qualquer ato que a atinja.

Hélio Tornaghi afirma que a expressão injuriosa deve ser considerada a invectiva, a descompostura, o insulto, a expressão imprópria e deseducada, que fere o brio de quem a lê ou escuta (Com. ao CPC, v. I, p. 148). De igual modo, o juiz não pode também se dirigir aos advogados, nos autos ou fora deles com ofensa alguma. Se isto ocorrer, o causídico pode representar contra ele e até argüir a sua suspeição no processo, conforme a dosagem do insulto, tal como prevê o Código de Organização Judiciária. O magistrado pode representar à Ordem dos Advogados do Brasil contra o advogado que, no curso do processo, se portar desabridamente, para que ela tome as providenciais cabíveis no caso e o puna, se for o caso.

O que o legislador desejou, com a regra inserta no art. 15 do CPC, foi evitar excessos que muitas vezes degeneram até em vias de fato, pois não se ignora que, no ardor dos debates judiciais , muitas vezes os causídicos se excedem.

Maurice Garçon disse que os polemistas mais cruéis são os que facilmente trocam a palavra exaltada por insultos, transmudando o entusiasmo em autêntica Arena de Gladiadores! Mas os advogados não chegaram a tanto.

Os magistrados muitas vezes são rigorosos com os patronos das partes, esquecendo-se de que “No seu ministério privado os advogados prestam serviço público, constituindo, com os Juízes e Membros do Ministério Público, elementos indispensáveis à justiça” (acórdão do então TARS constante do AI 185.052.313, in RTJE, v. 39/1.307) e que a Constituição Federal, em seu art. 133, reza que “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”. Não se deve olvidar, todavia, que eles são auxiliares da justiça. Se for na defesa oral que se excederem, ou no linguajar corriqueiro venham a perder as estribeiras, o juiz apenas os advertirá de que não continuem com as expressões ofensivas.

EMPREGO DE EXPRESSÕES INJURIOSAS NAS PEÇAS DO PROCESSO (Art. 15 DO CPC) – Tanto as partes como os advogados, principalmente estes, quando peticionarem no processo e empregarem expressões injuriosas, grosseiras, em relação à outra parte ou ao seu colega, o juiz pode, de ofício, determinar que o serventuário as risquem.

Como anteriormente já se deixou entrever, pode o juiz mesmo enviar cópias das petições dos ofensores à Ordem dos Advogados para que esta lhes apliquem o corretivo que entender.

Se as ofensas forem proferidas em defesa oral, o juiz, como já se disse, advertirá ao advogado para que não as use mais, sob pena de cassar-lhe a palavra. Bem é de ver-se que os advogados são invioláveis por suas manifestações mesmo quando perdem as estribeiras e realmente há os que assim procedem, perdendo-as, mas mesmo para isto há limites a serem observados. A Lei n° 8.906/94 realmente dispõe que o advogado goza dessa imunidade profissional e os exageros que cometerem nesse sentido não os sujeitam aos delitos de injúria, difamação ou desacato puníveis por suas atividades em juízo, mas convenhamos que para tudo tem um limite.

Bem por isso o STF tem decidido que as ofensas dessa natureza em relação a terceiros que nada tenha a ver com que se discute nos autos do processo " revela o exclusivo fim perverso de ofender, ultrapassando os limites da estrita utilidade que ditou a isenção penal " (ac. unânime da 1ª Turma do STJ no RHC 64.660-3-BA rel. Min. Moreira Alves, DO de 09-10-87, RTJ v. 123, p. 932). Decisão que achamos correta porque ninguém tem o direito de agredir a honra alheia por motivos meramente pessoais, ou sejam eles quais forem, especialmente no bojo de um processo judicial!


DANO PROCESSUAL - RESPONSABILIDADE DAS PARTES - (Art. 16 do CPC) - O tema tratado neste texto, que regra a má-fé processual do autor, do réu, de interveniente no processo (casos de consilium fraudis inclusive), demonstra que é sempre resultante dos pleitos de má-fé processual cometida por algum de seus partícipes contra o outro ou outros, o dano ou o prejuízo por estes sofridos, ou seja, em razão do procedimento astucioso do infrator, que, assim merece ser punido.Trata-se, como se vê, de punição ou castigo pelo prejuízo que vier causar no curso do processo, ou seja, antes dele haver sido encerrado.

A sanção que deve ser aplicada é o juiz obrigar o litigante de má-fé a responder pelas perdas e danos que possa ter causado à outra parte ou partes. Sanção pecuniária, portanto, que significará a contrapartida da má-fé, penalidade que se encontra prevista nos arts. 16 e 18 do CPC, por tratar-se de dano processual. A penalidade a ser aplicada contra o infrator será nos mesmos autos do processo, e não em outro distinto.

Caso os elementos probatórios existentes nos autos não bastem para o magistrado aplicá-lo de plano, determinará que o seu valor seja apurado em liquidação, como lembra Celso Agrícola Barbi (ob. cit. 7, p. 183). A toda evidência o juiz não poderá aplicá-la se não estiver cabalmente demonstrada nos autos, porque a má-fé não se presume.

Quer dizer, a parte que se sentir prejudicada com a má-fé da outra, para ser indenizada tem de provar quantum satis existência do dano processual sofrido. Como bem diz Hélio Tornaghi, o "... litigante de má-fé, além do prejuízo eventualmente causado à parte contrária, atenta contra a administração da justiça: a condenação ao pagamento de danos processuais, por isso, além do aspecto privatístico, têm a característica de verdadeira pena" (Coms. ao CPC v.I, p. 157). Essa penalização, como já esclarecemos, nada tem a ver com a do negócio jurídico sub judice.

DA LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - SUA CARACTERIZAÇÃO (Art. 17, incs. I, II, III, IV, V, VI e VII do CPC) - Litigar, sabe-se, é questionar em juízo, é pleitear o reconhecimento do direito perdido ou ameaçado de perda. É, enfim, reivindicar direitos, sejam eles de que natureza forem, isto é, de ordem moral ou mercantil, que se realizam através de contratos, convenções, ajustes, procedimentos que são incessantes, ou seja: litigar é reivindicar direitos em juízo. E sabe-se que o universo não é povoado apenas de pessoas de caráter bem formado, honradas! Nele existem também os trânsfugas, os velhacos, indivíduos astutos, desacreditados, espertalhões e que estão sempre ativos e prontos para obterem vantagens indevidas ludibriando terceiros com os quais procuram fazer negócios premeditadamente de má-fé para enganá-los.

A má-fé processual existe quando a parte deduz pretensão ou defesa contra texto expresso da lei, ou altera os fatos para obter vantagens indevidas, com o propósito ilegal de obtê-las. Ocorre também quando usa de recursos ilegais para alcançar seu objetivo desonesto e procura resistir injustificadamente, consciente de que está entravando o andamento legal do processo, não deixando dúvida de que, indubitavelmente, seu procedimento é audacioso e temerário, mormente quando cria incidentes processuais apenas para procrastinar o andamento do pleito judicial e atrasar o seu curso, convicta de que o seu direito não é bom, na esperança de forçar a outra parte a um acordo!

Qualquer um dos expedientes supra caracteriza a má-fé, por serem maliciosos, intencionais e condenáveis, pois todos são destinados a induzir o juiz a erro e com o propósito de aproveitar-se da lisura da parte com quem fez o negócio.

RECAPITULANDO: Considera-se litigância de má-fé todas as vezes que uma das partes se conduz maldosa, maliciosamente no curso do processo, ou seja: quando uma age intencionalmente com o propósito de prejudicar a outra, procedendo de forma iníqua, especialmente conspurcando o seu direito, infundadamente, procedimento típico de todo improbus litigator.

Foi para punir a litigância maldosa, maliciosa, pérfida, perversa, que o legislador cravou no texto ora comentado a sanção que o juiz deve aplicar a todo litigante que, de propósito, procura violar as normas processuais. Quer dizer, o juiz o pune por sua má conduta processual, por sua deslealdade, em face de seu procedimento inescrupuloso, por seu mau caráter!

Se o dolo processual não for enfrentado com rigor, essas modalidades de fraudes judiciais continuarão crescendo geometricamente. Até porque, em regra, os magistrados são bastante condescendentes com os que agem com má-fé processual. Como bem disse Arruda Alvim, "A lealdade e a boa-fé são regras informativas, de caráter ético, abrangente de toda atividade das partes, desde o início, durante todo o procedimento, inclusive no desdobramento recursal" (Coms. ao CPC , v. II, p. 131). De fato é necessário que se aplique essa modalidade de sanção aos que se comportam maliciosamente. Não se pode dar trégua a quem ofende propositalmente não apenas o direito da outra parte, mas,sobretudo, aos brios da administração da Justiça.

Como já dissemos anteriormente, em se tratando de má-fé processual, o juiz pode aplicá-la independentemente de pedido da outra parte, por tratar-se de manifesto ultraje à administração da Justiça.

Com razão, ensinou Pedro Batista Martins que o juiz não precisa mergulhar no pélago das intenções humanas para responsabilizar o litigante de má-fé pelos danos produzidos no exercício irregular, anti-funcional ou de outrem. Só as circunstâncias que envolvem o ato caem sob o controle da inspeção judiciária, que deve deter-se no fenômeno, na realidade intangível, do fato material objetivo (O Abuso do Direito e o Ato Ilícito, p. 250, n° 1, in fine 49).

DA SANÇÃO IMPOSTA AOS LITIGANTES DE MÁ-FÉ (Art. 18º, §§ 1° e 2° do CPC) - O juiz ou o tribunal, chegando a conclusão de que uma das partes está agindo de má-fé, cumpre-lhe aplicar a multa não excedente de 1% (um por cento) sobre o valor da causa, e obrigá-la a indenizar a parte adversa os prejuízos que sofreu, mais as despesas acaso ocorridas acrescidas de juros.

Se dois ou mais litigantes estiverem agindo de má-fé, deverão ficar sujeitos à aludida sanção, solidariamente, por haverem se coligado para lesarem a parte adversa.

O juiz, fixará desde logo o valor da indenização, que não poderá ultrapassar 20% do valor da causa, ou será liquidado por arbitramento. É isso o que preceitua o texto retro. E o fez simplesmente porque, anteriormente, já se disse que o litigante de má-fé responde pelas perdas e danos que eventualmente tenha causado à outra parte. O legislador afirma no art. 16 do CPC que quem fica sujeito a pagar perdas no caso é o autor, o réu ou o interveniente. Este é quem ingressa em processo alheio em face de ter interesse no desfecho da ação. Logo, o referido dispositivo exclui da responsabilidade os advogados das partes.

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